Cultura popular, preconceito e violência.
13:51
Expressão musical dos jovens das
comunidades populares, o ritmo funk se expande e conquista também a preferencia
da juventude da classe media. Em nosso Estado (RJ), somente nos finais de
semana, cerca de 1, 5 milhão de jovens frequentam os bailes funk.
Com grande tiragens de discos e
um programa de televisão líder de audiência em seu horário, o funk se
transformou, inegavelmente num fenômeno cultural da juventude,. O movimento
funk é um meio para os jovens expressarem linguagem e símbolos próprios e,
também, para manifestarem suas criticas sócias e vontade de participação.
Vendo seus filhos aderirem ao
funk à sociedade tradicional reage com preconceito e exige das autoridades
medidas repressivas. Um exemplo típico dessa atitude discriminatória está em
uma carta publicada em grande órgão da imprensa, em que uma mãe diz o seguinte:
“Meus filhos e os filhos de minhas amigas vizinhas estão sendo envolvidos, já começam a achar tudo muito lindo, o morro é uma beleza”. Por causa disso ela afirma que o funk “... é uma questão de segurança nacional”.
O que se vê nessas opiniões é o
preconceito elitista contra a mistura de classes sociais e raças, que é um
fenômeno sociocultural muito importante para o fortalecimento da tolerância e
da convivência democrática. Mais uma vez se confirmam o conservadorismo
extremado e a miopia politica das elites brasileiras, os maiores obstáculos
para o desenvolvimento democrático do País.
Mas, enquanto o funk é
considerado por setores conservadores uma “ameaça” a juventude, o desemprego e
a falta de oportunidades no mercado de trabalho causam frustrações e desespero
entre os jovens. Essa sim é uma situação que ameaça o futuro da juventude.
Do mesmo modo, quando a Petrobrás
e outras empresas estatais rentáveis e estratégicas são atingidas, isso não é
considerado uma ameaça a segurança nacional, mas apenas uma questão de
“modernidade”. Vivemos um dos momentos mais tristes de nossa história, quando o
orgulho nacional é ridicularizado, a juventude é abandonada e o povo é
considerado com um problema.
O funk vive um momento de
preconceito e repressão, do mesmo modo que, no passado, também viveram outras
formas de cultura, popular, como o samba e a capoeira, por exemplo. Mas, com
esses últimos acabaram triunfando, a vitória do funk será igualmente
inevitável. Não se pode matar uma cultura.
É um erro grave querer combater o
tráfico de drogas por meio da proibição dos bailes funk. Na atualidade, esses
bailes mobilizam a juventude e representam a sua principal forma de lazer.
Já o narcotráfico é um problema
de segurança publica e está presente não só nos bailes funk como também eventos
do samba, do rock, nas casas noturnas da Zona Sul e em muitos outros lugares
aparentemente insuspeitos. Sem uma vontade politica séria que combata a
corrupção policial e mobilize a sociedade, o narcotráfico continuará
disseminando o seu mal, mesmo que se acabe com todos os bailes funk da cidade.
A discriminação contra o funk,
como a realidade está mostrando, só vai aumentar a repressão policial contra
os jovens e alimentar ainda mais as manifestações de violência em seu meio. O
caminho tem que ser outro, com os poderes púbicos regulamentando e apoiando o
funk como manifestação cultural, abrindo os clubes para os seus bailes e não
proibindo, como fazem até agora.
A sociedade e os poderes públicos
tem a obrigação de ganhar a nossa juventude para a atividade cultural e um
lazer sadio, e não empurrá-la para os guetos da violência. Funk precisa ser tratado com tolerância e
compreensão, pois, afinal de contas, ele é um movimento cultural criado por
nossos filhos.
Quanto ao crime organizado, este
tem que ser combatido com firmeza e competência onde quer que atue, não apenas
nos morros, mas principalmente, no asfalto, onde se encontram as suas fontes e
seus protetores.
Créditos: Benedita da Silva – Ano: 1995
**Texto escrito há 24 anos e parece que estamos parados no tempo. Nada mudou!
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